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segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Baralho

(Abrem-se as cortinas.Uma mesa ao canto num foco de luz de branca. Um alguém embaralhando cartas e fumando.)

Me chamam de louco; louco. Os olhos cruzam tortos em minha direção reparando os detalhes dos panos que eu uso. Eu consigo perceber que há um estranhamento no olhar de cada de um; os padrões foram quebrados. Existem sim, os conservadores, mas o que está fora do convencional ainda assusta.

(Corta o baralho e divide cartas sobre a mesa pra jogadores invisíveis)

Porque o ás sempre tem que ser simbolizado por uma letra e não existe número um. Opa! Em algum o lugar não existe o número um. Então, não há vencedores e campeões e nem vices e lanterninhas. Ah! existe sim, o concreto algarismo um não dá suas caras no início do baralho mas, colocou sua prima vogal: A. Aquela que puxa a fila do alfabeto. Irmãos, fomos enganados.
O K (the King) pronunciou que não existiria o número um, no entanto, vimos o Ás! O aldacioso guerreiro que lidera todos os outros e destacando-se isoladamente, porque os outros são só números. Vejam: 2, 4, 6, 9, 10 e a família real. E não nos esquecemos por favor, do nosso honradíssimo coringa, ou bobo da corte como quiser.
Queiram as Q (Queens) fazerem o que quiserem, mas sempre os J's (Knaves) serão nada mais, nada menos que os valetes (patifes da monarquia).

No mais, o que se esperar de um CardPlayer nos tempos de hoje?

(Risada. Apaga o cigarro num cinzeiro e recolhe as cartas. Fecham-se as cortinas)

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Oito e catorze

E de repente eu sentí um impulso pra correr até a porta, abrí-la e me deparar com um rosto - até então - desconhecido, que não importa quem seja, mas que seja alguém segurando uma caixa de bombons, um ramalhete ou até mesmo a chave do carro. Tomaria-me em seus braços e num apertado abraço falaria que estava morrendo de saudades. E no canto do olho direito a gotícula surge a dá um toque salgado no beijo. Hum! E em mais um par de segundos eu ouviria bem baixinho na sapatilha do ouvido: saudades! Os meus pêlos se arrepiariam, minha boca sorriria e minha alma vibraria.
E de repente a brisa do ventilador velho, comprado na lojinha de um-e-noventa-e-nove me despertou. Sentí fortes agulhadas no peito e a vontade foi de chorar, fazer promessa, voto de castidade ou cair na gandaia.
A senhora solidão ainda é minha vizinha. Mora alí do lado e vira e meche me lembra de que estou sozinho, de que apenas o sol e a lua são meus companheiros e que a relação mais íntima que eu tenho é com as minhas cuecas.
E de repente prefiro pensar que o melhor dos gozos virá por breve e a melhor solução pra tapar a cara da minha vizinha é trancar a janela com os cadeados risonhos.

E droga de repentes!